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"Eu? Tenho um sonho para realizar."


Parece-me um atrevimento, mas ainda bem que foi apenas um sonho.

Meus sonhos são, em sua maioria, pedaços de uma mente ainda infantilizada e rancorosa. No entanto, há sonhos que me surpreendem e deles, gosto de extrair algumas histórias.


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Chovia muito nesse sonho. Deve ter sido em alguma madrugada da semana passada. Desejei muito a chuva que surgiu. Sim, isso é natural, (faz um calor desgraçado aqui onde moro) natural porque não apenas sou muito apegada a dias nublados e cinzentos, como também me sinto mais à vontade do que o comum em dias chuvosos.

Não costumo adormecer rapidamente, mas assim que durmo, sonho com bastante pressa. Até me incomoda, muitas vezes.

Havia esse rapaz e talvez, só talvez, eu fosse o próprio céu. O que é confuso, pois no sonho, eu também conseguia compartilhar da dor que sentia o rapaz.

Estávamos na praia, no mar, por entre ondas violentas. Uma tempestade nos assolava. Não me atingia, apenas me animava.

Ele me encarava e eu o encarava de volta. Porém, ele não me enxergava. Não como eu o enxergava.

Criou-se uma dissonância e eu quis, imediatamente, escapar dali. Mas eu estava presa aos céus. E ao rapaz.


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Ele me segurava com seu olhar desolador, seu semblante perdido e sem vida, sua postura desengonçada e digna de pena.

HÁ! Não havia nada que eu pudesse fazer por ele. É bom deixar claro. Algo me dizia que ele queria ser salvo, mas eu não podia salvá-lo. Difícil dizer também se eu queria salvá-lo.

Eu observava tudo. Absorvia tudo. Mas era incapaz de sentir compaixão. Era como se ele merecesse aquele abandono. E eu, estivesse apática, pela primeira vez em muito tempo.

Imaginei depois o motivo e o motivo era muito claro, ora. Eu não o conhecia. Não sabia de seus atos ou males. Ainda que eu compreendesse seu olhar, era mais fácil ignorá-lo.

De repente, ele bradou. Bem, não para mim, mas para os céus.

“Deus, deixe-me viver!” gritou o rapaz no sonho, de joelhos na praia, preso em uma tempestade, enquanto exigia dos céus algum direito restante.

Ah! Compreensível.

Imaginei-me sentada em uma cadeira de ouro, vestida de um longo vestido e adornos na cabeça. O que eu poderia responder? Eu estava longe de ser uma boa conselheira, quem dirá Deus.

Por qual razão quer viver?” perguntei de volta, mas não ouvi minha própria voz.

O rapaz a escutou, no entanto.

Memórias… memórias…” disse ele, tão fraco.

Pigarrei, mas foi sem querer.

Imagens, vozes, memórias… nada vai embora. Elas estão sempre aqui. Meus amigos, meus sonhos.” continuou ele.

Hum. Não o respondi de imediato. Acho que fiz uma careta, não tenho certeza.

Qual era o desejo dele, de fato?

Às vezes, precisamos abandonar as coisas que gostamos. Deixá-las para trás pode ser a melhor escolha.” Eu disse, tão convicta.

Sobre o que eu estava tentando convencê-lo? Não me lembro. Mas o homem achava estar falando com Deus. Eu precisava ao menos soar elegante.

Não quero morrer” ele falou.

Então, não morra” disse eu. E continuei: “Não é simples? Por que está fazendo disso um caso? Espere a chuva passar e…” nesse momento, fiquei sem ideias. Era complicado imitar Deus.

Eu queria desaparecer completamente e nunca ser encontrado.” falou ele, caminhando em direção as ondas.

A chuva vinha forte e eu queria aproveitar mais um pouco. O rapaz, no entanto…


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Eu queria não ter sonhado rápido demais.” disse ele, sendo tomado pelo mar. Ele estava mesmo desaparecendo, será que ainda me ouviria?

Escute-me, você pode apenas voltar, sim? Seja valente. Haverá mais desse sentimento. Dúzias, milhares. Melhore suas palavras, essas permanecerão para sempre…

Não pude continuar.

Eu não estava mais nos céus, estava me afogando!

Estava nas ondas, por entre a tempestade, presa ao mar violento! O que era um absurdo, pois eu jamais entraria em um mar assim.

O que me fez perceber… meu ponto de vista havia mudado e eu era o rapaz.

Era a história dele, dos sonhos dele e de sua realidade.

E, obviamente, não queria isso para mim. Acordei de um susto, por volta das quatro horas.

O subconsciente te humilha. Duas vezes. Enquanto você dorme e depois que acorda.

O interessante lembrei depois.

Qual resposta eu daria a minha própria pergunta?

“Por qual razão quer viver?”

Bem, eu? Se eu respondesse com sinceridade, com genuína honestidade…

“É que eu tenho um sonho para realizar, aqui e acolá.”



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