Derrubem Este Amor
Webnovel | Gênero: Romance, drama | Classificação: + 16.
Contém violência, temas sensíveis.
Prólogo
Claire acordara cedo apenas para correr. A manhã estava como gostava — nublada, meio cinza e meio azul. Era o contrário das pessoas, não era o sol que lhe trazia motivação, mas sim, um céu em desalento. Não era proposital, não queria ser do contra. O que sentia era genuíno — preferia os outonos e os invernos do que as primaveras e os verões.
Correu muito rápido, como se fugisse de seu prédio opulento, de seus lençóis macios, de sua casa segura e de seu marido adormecido em outro quarto — bem longe do seu. Deu uma volta completa ao redor do cruzamento, atravessou o parque e terminou a corrida caminhando devagar perto do rio. Parou, embora não estivesse cansada, e dedicou alguns minutos do seu tempo para observar o horizonte.
Apoiou-se no guarda-corpo da ponte, flexionando as mãos protegidas por luvas de couro. Estavam suadas. Incomodava, mas não chegava a doer. E, mesmo que doesse, não as tiraria. Como poderia? Sem as luvas, quem seria, verdadeiramente? Alguém do passado que não poderia nunca retornar.
Ao longe, avistou barcos de pesca. Flutuavam no rio, objetivamente perdidos. Queria ser como eles. Queria ser um barco e ter um pescador no controle de sua vida. Seria o menor dos barcos, o mais frágil e mais descascado. Assim, seria destruída na primeira onda que a tomasse por inteiro. Seria o caminho mais fácil.
Havia, porém, uma acidez no ar. Um cheiro estranho, trazido de fora, que, curiosamente, lhe agradava. Se ela inspirasse o suficiente, poderia até sentir um gosto amargo na boca. Não tão exato ou cortante quanto os dias que vivia, mas ainda assim presente, salgado e cítrico. Onde tudo a acontecer fora do seu círculo era suportável. Onde poderia estar, tranquila.
Prendeu-se àquela visão. Uma chuva leve começou a cair e, de repente, nada mais precisava fazer sentido.
Não se moveu. Nem puxou o capuz do casaco. As gotas eram inofensivas, gentis demais para serem evitadas. Claire imaginou que talvez nem as merecesse.
O céu chorava — e ela não tinha como consolá-lo.
— Senhorita? — Um guarda-chuva surgiu sobre sua cabeça. Claire não precisou se virar. — Trouxe-lhe uma bebida quente. Chá-verde com leite e canela. Sem açúcar.
Claire espiou seu motorista de lado. Ezell tinha poucos mais de cinquenta anos. Tinha duas características marcantes, uma barbicha grisalha e grossas sobrancelhas. Os olhos tinham cor de avelã, a pele era parda, mais bronzeada nas mãos. O homem vestia um terno chique — de linho, azul-marinho.
— Decidiu usar o meu presente — disse Claire, puxando um sorriso de lado. Virou-se, aceitando o copo. — Por que logo hoje? Era para o aniversário da sua filha.
Ezell endireitou a postura, passando a mão livre pelo paletó.
— A senhorita disse que hoje era um dia importante — falou ele com muita tranquilidade.
Claire piscou. Tomou um gole da bebida e deixou o olhar cair sobre os pés.
— Não acredito que levou ao pé da letra — comentou baixo. — Já que é assim, também preciso me vestir bem, não é?
— Está sempre bem vestida, senhorita.
Com uma careta no rosto, Claire deu passos para longe da ponte. Ezell a seguiu, ainda a protegendo com o guarda-chuva.
— Devo usar vermelho? — perguntou, enquanto iam em direção ao veículo.
— Mas não gosta de vermelho — salientou Ezell ao abrir a porta para ela.
— Estou indo terminar o caso do meu marido. O que acha?
No banco de trás e com o olhar impassível, Claire aguardava a resposta de seu motorista. Para ela, parecia essencial ouvi-lo. Ezell fez contato visual pelo retrovisor.
— Se é assim, acho que deve usar vermelho, senhorita — afirmou ele.
Claire assentiu. O automóvel saiu de onde estava estacionado em direção à avenida. Ela correu os olhos pelo movimento das pessoas. Não esboçou nenhuma expressão significativa ao dizer:
— Então, vamos. Vamos encontrá-la.








